A grandeza que a foto sugere, em 40 anos, será apenas isso, uma foto! E Parauapebas? |
A Vale anuncia que a principal jazida
do melhor minério de ferro do mundo será exaurida ao longo de 40 anos. Trinta
anos antes, quando deu início à sua atividade em Carajás, no Pará, a previsão
era de que a mineração se prolongaria por 400 anos, mas só considerando o
volume de minério que podia ser lavrado a céu aberto e com volume ainda não
completamente avaliado. Se as frentes de extração em Carajás seguirem o
planejamento da empresa, essa história não irá além de um século.
Trinta anos antes a Vale não teria a
tranquilidade que ostenta ao anunciar que o maior investimento da sua história
e o maior que está sendo realizado no momento em todo mundo, no valor de quase
20 bilhões de dólares, terá duração de 40 anos.
Haveria reação, mesmo ainda sob um
governo militar, o último, em seus estertores, do ciclo da ditadura. Sem
dúvida, reação do pessoal técnico. Provavelmente, da opinião pública também.
Jamais um vaticínio dessa gravidade seria recebido sob o silêncio sepulcral de
hoje, o que explica a tranquilidade da Vale.
O açodamento da mineradora na
consumação do destino de Serra Sul tem sua razão no receio de que haja reflexão
um pouco mais atenta por parte da sociedade sobre o que significa submeter um
patrimônio tão valioso a um processo de exploração tão intenso, visando
exportar maciçamente um bem praticamente in natura.
Aos preços de hoje, apenas Serra Sul
proporcionará uma receita média anual de quase 10 bilhões de dólares. No
período de quatro décadas, o faturamento atingirá US$ 400 bilhões, 20 vezes o
valor do investimento.
Parece muito, mas não é. Cálculos
feitos a partir do beneficiamento do minério bruto chegarão a valores
incomparavelmente superiores. A Vale não está se importando com o que pode
ocorrer na escala de transformação do seu produto. Ela é apenas mineradora (ou,
cada vez mais, uma empresa de logística que faz circular minério por seus
trens, portos e navios) e ponto final. Para a nação, isso é um crime.
Como empresa privada (que,
efetivamente, não é: continua a ser, de direito, mesmo que não de fato, empresa
privada, por mero oportunismo e má fé do governo federal), ela pode até
justificar a estratégia de passar a tirar 250 milhões de toneladas anuais de
Carajás, a partir de 2017 (10 vezes mais do que o máximo de produção previsto
no projeto original), e remeter essa riqueza além-oceanos.
Tal volume de minério singrando entre
os oceanos já reforçaria o peso mundial da mineradora. Mas trata-se do minério
que mais contém hematita de toda a crosta terrestre. Não há nenhum outro
semelhante ao de Carajás. Assim, se o preço do minério no mercado internacional
cair até pela metade (de 100 para 50 dólares a tonelada, por exemplo), a Vale
será das poucas que ainda terá margem de lucro para sobreviver. Graças à excepcional
qualidade do produto que comercializa e à facilidade em extraí-lo do sobsolo,
através de lavra a céu aberto.
Esse seguro contra qualquer crise de
mercado e em favor da hegemonia da companhia é estabelecido à revelia do
interesse nacional. Se o Brasil ainda tivesse uma política mineral, não
permitiria o saque alucinado sobre Serra Sul.
Guardaria essa reserva para o futuro,
desenvolvendo pesquisas e realizando experimentos com minérios menos nobres. Ao
mesmo tempo, fomentaria a atividade industrial, para impedir essa prática
colonial de exportar matéria prima.
Há no momento um caso exemplar a servir
de patética advertência contra a atitude assumida pela Vale. As obras da
ferrovia Norte-Sul, que foram retomadas na tentativa de concluir um trecho
empacado há vários anos (entre Palmas, a capital do Tocantins e Anápolis, em
Goiás), pode parar de novo. É que faltam trilhos.
Dois anos atrás, a Valec, responsável
pela obra, teve que cancelar um contrato com a firma chinesa Dismaff, por causa
da má qualidade do material (além de irregularidades administrativas). Uma nova
licitação foi realizada. Quem a venceu foi outra empresa do dono da
Dismaff.
O contrato foi novamente questionado
pelo Tribunal de Contas da União. Para tentar encontrar outro interessado, a Valec
fracionou a compra em lotes de 30 mil toneladas cada. Se, diretamente ou por
via oblíqua, a Dismaff for de novo a vencedora, a construção da ferrovia terá
que parar.
A pergunta óbvia que se faz é: por que
o Brasil, tão rico em minério de ferro, não fabrica trilhos, estando em
andamento um plano nacional de novas ferrovias? Nem sequer trilhos o Brasil
pode fabricar. Recorre a produtos chineses, que, nesse caso, não parecem estar
sendo fabricados com o minério de Carajás, do qual a China é a maior compradora.
Certamente a penetração chinesa nesse
mercado deve-se ao baixo preço da mercadoria que oferece. Mas já não há dúvida
de que ela não tem a qualidade exigida, como não tem o cimento que em escala
crescente é importado de lá. O motivo dessa preferência é o preço: o cimento
chinês atravessa os mares e chega a Belém do Pará, a terra do minério, por um
preço que é praticamente a metade daquele praticado pela Cibrasa (do grupo João
Santos, do cartel nacional) nas suas duas fábricas paraenses – aliás, implantadas
com a colaboração do governo federal, através de renúncia fiscal.
Os brasileiros continuarão a assistir,
desinteressados, a esses absurdos, que resultam de uma prática ofensiva aos
interesses estaduais, regionais e nacionais? O silêncio em relação a essa
situação não é daqueles que o filósofo considera de ouro, em comparação com a
palavra, apenas prateada. É um silêncio de quem, considerando inevitável o
estupro, relaxa e aproveita.
Fonte: www.yahoo.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário