O presidente está menor 70 dias depois da posse. Nem foi preciso esperar que a realidade frustrasse as expectativas
O CAPITÃO JAIR BOLSONARO, QUE GOSTA DE GANHAR AS COISAS NO GRITO – E PELAS REDES SOCIAIS (FOTO: MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL) |
Um erro comum na análise política é interpretar as vitórias eleitorais como sinal da superioridade dos mais votados e da inferioridade dos derrotados. Os ganhadores seriam “melhores” porque souberam “se dar bem”.
O tempo passa e, muitas vezes, chega-se ao oposto. Quem ganhou se apequena e o derrotado fica maior. Ri melhor quem ri mais tarde.
Mais de 70 dias depois da posse, Bolsonaro está menor, antes sequer de que o desgaste inevitável do governo produza efeitos. Não tem sido necessário aguardar para que a realidade frustre as expectativas da população.
Em seu caso, essa tendência à entropia é acelerada e agravada pelo discurso de campanha. Tomando emprestada a ficção, disseminada nas elites e nas classes médias, de que todos os problemas nacionais são “culpa do PT”, Bolsonaro dispensou-se de fazer qualquer diagnóstico sério e adotou o antipetismo como bandeira fundamental. De própria, apenas uma ideia: “Matar bandido”.
Se os problemas brasileiros se resumiam a um só, a solução era simples e produziria resultados imediatos. Removido o PT, tudo estaria resolvido, ou, no mínimo, encaminhado, em questão de meses. Como é evidente, isso não aconteceu e não vai ocorrer em qualquer prazo razoável, muito menos no prometido.
Mudança foi apenas um solavanco
Quem saudou a vitória de Bolsonaro como demonstração de competência e sagacidade política talvez admita o equívoco. É bem possível que, em horizonte não muito distante, todos venhamos a perceber que, ao contrário de inaugurar uma “nova era”, ela não foi mais que um solavanco, uma espécie de mal súbito que acometeu um pedaço de nossa sociedade, do qual está se recuperando mais cedo do que o previsto.
Fez parte da supervalorização do resultado a imagem de um tsunami que teria varrido a política brasileira, com a vitória do capitão e o séquito de bizarrices que com ele foi para o Congresso Nacional. Ainda hoje, especialmente na mídia internacional, há quem insista nessa lenda. Alguma aritmética ajuda, contudo, a ver que a noção de maremoto é descabida.
Não há dúvida de que são muitos os 10 milhões de votos que Bolsonaro obteve a mais que Fernando Haddad no segundo turno, mas, nas eleições presidenciais dos últimos 25 anos, só superam a vantagem que Dilma Rousseff conseguiu em relação a Aécio Neves em 2104. Fernando Henrique, em 1994 e 1998, Lula, em 2002 e 2006 (quando estabeleceu o recorde ao bater Geraldo Alckmin com 21,2 milhões de votos de frente) e Dilma em 2010, todos venceram com margens mais dilatadas que o capitão.
Seu partido de aluguel, o PSL, beneficiou-se do ambiente que o elegeu, mas com resultados que não chegaram a significar nenhuma inundação. Recebeu 11,4 milhões de votos para a Câmara dos Deputados, o que representa 7,7% do eleitorado brasileiro. É um número expressivo, embora queira também dizer que mais de 92% dos eleitores preferiram outras opções.
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