quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

A república miliciana e seu braço togado que ataca e agride o presidente LULA

Lula é sistematicamente discriminado pelo Estado Brasileiro, por César Locatelli 


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Mais de 400 juristas repudiam decisão que impediu Lula de se despedir do irmão


A juíza federal Sra. Carolina Lebbos, a procuradora de justiça Sra. Carmem Elisa Hessel, o superintendente da Polícia Federal em Curitiba Sr. Luciano Flores, o desembargador Tribunal Regional Federal da 4ª Região Sr. Leandro Paulsen e o presidente do Supremo Tribunal Federal Sr. Dias Toffoli proibiram o ex-presidente Lula de se despedir de seu irmão Genival Inácio da Silva, falecido na terça-feira, 29/01.

Contrariaram, individual e coletivamente, aos olhos de quem se dispuser a ver, a norma mais cara ao mundo civilizado: ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos ou degradantes. “Quem luta pela consolidação dos direitos fundamentais e acredita na Justiça como meio de construção de uma sociedade mais humana repudia esse abuso”, bradaram os juristas em nota publicada pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).

A ação dessas pessoas é injustificável e imperdoável, como ressalta o ex-procurador Roberto Tardelli: “desde que o samba é samba, dificuldades materiais não podem impedir o direito do preso, de dar seu último adeus a um ente querido. Se a Polícia Federal não possui condições, então que permitisse que ele fosse por conta própria, coisa que já vi acontecer”.

Em texto publicado em seu perfil no Facebook, o ex-procurador Tardelli prossegue:

"A negativa, a par de abusiva, é sobremaneira cruel e reflete uma polícia que parece se comprazer com o sofrimento atroz que impôs a seu preso mais ilustre. Foi uma demonstração de um poder tirânico, que se coloca acima da lei, que despreza a lei por razões burocráticas, tão vazias quanto impiedosas.
Se Lula não for ao velório, se nada acontecer diante dessa absurda negativa, referendada pelo Ministério Público Federal, em um parecer desses que entrarão para a História, no que ele possui de delirante, então, a conclusão única a se permitir: vivemos em um estado de exceção, em que direitos elementares são ignorados em nome de razões oficiais carimbalistas."

As condições impostas por Toffoli, ou por quem o comanda, são, em última análise, uma rejeição ao pleito de Lula. Toffoli deu sua decisão em horário bastante próximo ao marcado para o enterro, sem que houvesse tempo hábil para a ida do ex-presidente ao enterro. Além disso, o ministro determinou que, para que Lula pudesse vê-lo, o corpo do irmão do ex-presidente deveria ser levado a uma unidade militar e deveria ser proibido o uso de celulares e de outros meios de comunicação externos. A presença de imprensa e a realização de declarações públicas foram igualmente vedadas.

“É preciso que Lula, em nenhuma hipótese, seja visto ou ouvido. É preciso que ele morra em vida, na escuridão do silêncio.” Assim Fernando Brito, do Tijolaço, resumiu com precisão o que mais uma vez ficou evidente no tratamento dado ao ex-presidente.

“Seria muito melhor que ele tivesse indeferido” afirmou o professor de Direito Processual Penal Sérgio Graziano. “A lei é clara, entretanto todas as esferas consultadas deixaram de cumpri-la. Isso soa muito mais como um deboche" afirma o jurista em relação ao deferimento da autorização. “E o pior é essa faceta estranha de colocar os militares como paladinos da ordem, da moralidade, da certeza do cumprimento de decisões”, criticou.

Perguntado se a constante violação das leis, que observamos, se devia à formação dos advogados, Graziano afirma que o cumprimento das leis, por parte de advogados, juízes, promotores e delegados, depende muito mais da formação dessas pessoas do que propriamente da formação do advogado. Ele entende que o modo de produção capitalista impõe uma competição desregrada ao ser humano e leva nossa sociedade a uma situação em que vale-tudo também na aplicação da Justiça. Ele conclui:

“Essa decisão do ministro Toffoli, infelizmente, é uma decisão absolutamente ilegal, mas normal, dentro do padrão de mundo, do padrão de formação de cultura, uma cultura escravocrata, uma cultura de exclusão do outro, que nós vivemos. É muito mais do que a formação do jurista, essa questão ultrapassa tudo isso e chega à nossa formação de séculos.”

Sobre a decisão do ministro, o advogado criminalista Fernando Hideo é categórico "nega-se o direito de estar presente no sepultamento do irmão e confirma-se a ascendência militar em mais uma medida de exceção contra Lula. Nem a ditadura militar foi tão cruel e arbitrária com Lula."

Os mais de 400 advogados, professores universitários e defensores que assinam a nota publicada pela ABJD repelem as discriminações que sistematicamente vêm sendo impostas ao ex-presidente Lula:

Lula não deve ser tratado de forma mais benevolente que qualquer cidadão brasileiro, mas a Justiça não pode furtar-lhe um direito fundamental, a pretexto da incapacidade da poderosa Polícia Federal assegurar o seu legítimo exercício. Ao negar um direito individual indiscutível, de caráter humanitário, ao ex-Presidente Lula, argumentando-se com sua condição pública e política, o Estado Brasileiro claramente viola uma das Regras de Mandela das Nações Unidas sobre o tratamento de presos: “Estas Regras devem ser aplicadas com imparcialidade. Não haverá discriminação baseada em raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou qualquer outra opinião, origem nacional ou social, propriedades, nascimento ou qualquer outra condição”.

Lula vem sendo discriminado sistematicamente pelo Estado Brasileiro por suas opiniões políticas, ao ponto de ver cerceado seu direito à manifestação. O Estado Brasileiro impediu Lula de ser candidato a Presidente da República. O Estado Brasileiro impediu Lula de dar entrevistas. O Estado Brasileiro impede que Lula chore por seu irmão.

"Eu nunca indeferi esse tipo de pedido em 20 anos de magistratura. É [para quem está preso] um sofrimento indescritível", disse o juiz da Vara de Execuções Penais do Amazonas, Luís Carlos Valois, à jornalista Maria Carolina Trevisan. "Existe uma cultura de achar que o preso é um objeto do Estado. Mas ele não é. É um cidadão que está cumprindo pena e que tem direitos e deveres. O Estado deve fazer o máximo para que esse direito seja contemplado."

“(…) o judiciário se expôs e evidenciou um viés persecutório e cruel, elevando a angústia e o sofrimento de quem já está encarcerado. Não se trata gente assim”, finalizou Trevisan.

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Notas

1 Para ver a íntegra da nota de repúdio da ABJD à decisão que impediu o ex-presidente Lula de comparecer ao enterro do irmão:

https://drive.google.com/file/d/1zvUsENWUFpvp60Xw9VUX2Gqfi-II6vzP/view

2 Para ver o texto completo do ex-procurador Roberto Tardelli em seu perfil no Facebook:

https://www.facebook.com/roberto.tardelli/posts/10214639124039993

3 Para ver a matéria de Fernando Brito, Lula não é só preso político, é um homem que não pode ser mais visto, no Tijolaço:

http://www.tijolaco.net/blog/lula-nao-e-so-preso-politico-e-um-homem-que-nao-pode-ser-mais-visto/

4 Sérgio Graziano, Fernando Hideo e Roberto Tardelli são membros da ABJD e signatários da nota de repúdio da ABJD.

5 A matéria Justiça expõe viés persecutório ao dificultar ida de Lula a enterro, de Maria Carolina Trevisan, está em: https://mariacarolinatrevisan.blogosfera.uol.com.br/2019/01/30/justica-expoe-vies-persecutorio-ao-dificultar-ida-de-lula-a-enterro/

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